“A Cutia e a Castanheira” é um livro muito pedagógico. Aborda a questão da Amazônia, uma história de animais reunidos no momento de aflição, da destruição da sua casa, da terra, da Amazônia, e como é possível reerguer essa casa. Então a gente pode falar que estamos diante de uma narrativa territorial que parte de uma aldeia, a Amazônia, para pensar o mundo, para pensar a humanidade, para pensar a terra, para pensar todos nós, como filhas e filhos da floresta.
Ao mesmo tempo que é uma narrativa de um habitat, estamos diante de uma reunião de animais em um momento de aflição, conversando e pensando como não morrer, como resistir, como reerguer a casa, a terra, a floresta. É uma narrativa que vai além de uma fábula. Estamos diante de uma Cutia que partilha saberes da floresta.
A Cutia, o Tatu, a Coruja, o Macaco estão conversando sobre a gente, sobre essa casa que é a casa de todos nós. Bichos, pessoas e árvores. Então é uma narrativa muito bonita por essa perspectiva da alteridade. Eu sou a Cutia, eu sou o Macaco, eu sou a Coruja.
Quando a gente começa a ler o livro, a Cutia diz: aqui, na realidade, era a nossa casa e havia uma floresta de castanheiras, como se fosse uma montanha de castanheiras. E quando ela pergunta para o Macaco, o senhor sabia que há castanheiras que podem durar mais de mil anos? Então é muito interessante essa reflexão, o exercício de linguagem do autor, porque os animais estão pensando sobre a sua casa de bichos da floresta, como nós, bichos também da floresta.
Gosto de pensar assim, a Cutia, a Coruja, o Macaco, sim, bichos da floresta, conversando sobre a sua casa. Mas estão conversando também sobre a nossa casa, nós também, como bichos da floresta, bichos da terra, bichos dessa terra, bicho dessa terra-água, dessa terra-anfíbia, como diz o Romualdo.
Então, é muito interessante como a Cutia sempre nos leva a essa reflexão de que é preciso, sim, uma outra terra, uma reinvenção, uma replantação de um outro território. E a Cutia já fala sobre a agrofloresta. Então acaba sendo sempre essa ideia da permacultura, da agrofloresta. Acaba sendo sempre um exercício de linguagem que não nos faz pensar só sobre a Cutia e nem só sobre os bichos.
Eu acho que o autor escreveu uma história pela perspectiva do jornalista que se forma nessa terra, que pensa essa terra o tempo todo, mas é literatura, é literatura que nos alcança, é literatura que nos reflete, é literatura que nos deixa naquele estado de suspensão. E em nenhum instante o Paulo Ferreira faz referência ao ser humano, à mulher e ao homem, mas nós estamos desde a primeira até a última página nessa história. Afinal “tem bichos que não sabem ouvir nem sabem escutar. E tem bichos que pensam que as árvores não sabem falar”.
Eu acho que é uma história para estar nas escolas, é uma história necessária, É uma história que traz toda uma poética, da reflexão sobre o nosso estar no mundo, sobre o nosso estar nessa terra. E é uma história profundamente ambientalista sem ser pedagógica. E isso eu achei ainda mais interessante.
No final do livro também tem uma coisa que é muito importante para a sala de aula: o glossário. E o glossário é fantástico. Repito mais uma vez, é uma história sobre um habitat, sobre uma terra, uma história sobre bichos, mas esses bichos também somos nós. Somos as pessoas que se reconhecem nas palavras do autor (texto extraído da fala do escritor Daniel Leite, por ocasião do lançamento virtual do livro de Paulo Roberto Ferreira, em 17 de março de 2025, em Live pelo Facbook).
Ilustrações: Sérgio Bastos (capa) e Isabele Cristina (miolo)
Felipe Alves de Macedo, o Filipinho, deixou a Terra. Foi ao encontro de seus companheiros de luta no Araguaia: Raimundo Ferreira Lima (Gringo), João Canuto, Expedito Ribeiro e tantos outros bravos camponeses que lutaram e tombaram na luta pelo direito de viver e produzir no campo. Dedicou seus 81 anos de vida ao cultivo da terra como animador de comunidade, na organização e resistência dos lavradores, em Conceição do Araguaia. Filipinho foi presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Conceição do Araguaia, dirigente da Central Única dos Trabalhadores (CUT-Pará) e membro do Partido dos Trabalhadores. Viveu parte de sua vida sob ameaça de pistoleiros a serviço do latifúndio. O ex-dirigente do STTR fez parte de uma lista de “marcados para morrer”. O repórter-fotográfico João Roberto Ripper, que integrou a agência F-4, fez um registro, em 1980, com seis pessoas ameaçadas: Maria da Guia, Josimar, Filipinho, Oneide Lima (viúva do Gringo), Luiz Lopes e João Pereira. O jornalista, em...





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