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Mostrando postagens de 2020

O Apagador de Florestas - Resenha

Armando Diniz Guerra Prof. Dr. do Instituto Amazônico de Agriculturas Familiares/UFPA Conheci Paulo Roberto Ferreira nos finais dos anos 80 do século passado, nos corredores do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, o NAEA da Universidade Federal do Pará. Fazíamos o Mestrado em Planejamento do Desenvolvimento em turmas diferentes, mas sabíamos dos projetos uns dos outros. Ele fazia algo ligado ao trabalho assalariado, não me lembro mais sob que orientador. Depois ouvi muito falar bem dele pela professora Violeta Loureiro, por conta dele lhe ter cedido todas as entrevistas que fizera com Quintino, camponês justiceiro da região de Viseu, abatido pelas forças policiais do então Governador Jader Barbalho. Voltei a encontrá-lo trabalhando na TV Cultura do Pará e encontrei, na Biblioteca da Embrapa, seu livro sobre Felisberto Camargo. Depois disso assisti, na TV Cultura, uma longa entrevista feita por ele a Emeleocípio Botelho de Andrade, ex-chefe da Embrapa Trópicos Úmidos, sobre o mesmo

Mausoléu do Bondinho

Em ano de eleição municipal a expectativa era grande. Tinha até bolão para saber quem acertava o resultado: liberação ou manutenção do aprisionado bondinho. Tinha sempre um candidato que prometia alforriar o vagão turístico; contava com muitos simpatizantes e aparecia bem na corrida em busca de votos. De outro lado, muitos eleitores apoiavam o postulante que anunciava manter o bondinho encarcerado. O tema dividia a cidade em duas grandes torcidas, semelhante aos clássicos de futebol: Palmeiras e Corinthians; Vasco e Flamengo; Grêmio e Internacional; e Remo e Paysandu. Na pauta das eleições, os outros problemas da cidade eram tratados de forma secundária. O que mobilizava, o que atiçava mesmo os militantes dos partidos era o destino do bondinho. Os discursos polarizavam-se: contra e a favor da circulação do veículo. Formaram-se as torcidas organizadas. Paixão do Bondinho, Nação James Bond eram as dos fanáticos pela liberação do veículo. A favor do enclausuramento, a Charanga da Masmo

Lei Anilzinho – a lei do posseiro - Experiência de resistência dos camponeses do Baixo Tocantins

A organização dos trabalhadores rurais no Pará criou uma lei que não passou por nenhum parlamento oficial nem foi promulgada por qualquer representante do poder executivo. Foi aprovada pelos lavradores e cumprida por eles mesmos. Virou uma referência para o movimento de luta pela terra no Brasil. A “Lei Anilzinho”, foi instituída num encontro na localidade de Anilzinho, município de Baião, na região do Baixo-Tocantins, nos dias 8 e 9 de julho de 1980. O evento reuniu lideranças de posseiros e pequenos produtores e estabeleceu as regras para resistir e lutar contra os grileiros, que expulsavam e tomavam conta das terras. O registro deste acontecimento foi feito no jornal “Resistência”, edição número 15, de agosto de 1980. A matéria foi escrita por José Maria Souza, professor da UFPA e assessor da Fase Amazônia Oriental. Ilustrada por Lucídio Oliveira Monteiro a narrativa revela que grileiros de terra expulsaram diversas famílias de agricultores que viviam, em sucessivas gerações, em to

Docudrama sobre a entrada da semente de café em Vigia de Nazaré

Com roteiro do jornalista paraense Nélio Palheta e do cineasta português José Borges “A semente do ouro negro” já está disponível no Youtube. O docudrama (documentário + dramatização) teve locações em Belém e no município de Vigia de Nazaré, região nordeste do Pará. Revela a história da missão do sargento-mor Francisco de Mello Palheta à Guiana Francesa, envolta em lendas e romance para trazer a planta do café, A ordem no território francês não permitia que a bebida, bem como sementes e plantas pudesse chegar ao domínio português. Além do Pará, o filme tem locações no Rio de Janeiro, na cidade do Porto, Paris e na Etiópia. Da colheita à torrefação artesanal na localidade de Itapoá (Vigia) a película mostra o processo industrial do café na Nestlé de Portugal. O radialista Paulo Brasil interpreta Francisco Palheta e o poeta José Ildone Soeiro fala das várias versões sobre a tática do funcionário do governo brasileiro para trazer o café, além da hipótese que o cultivo da planta começou pr

Antes da cobertura do vestibular de 1981

Hoje é dia de recordar do tempo em que eu trabalhava no jornal O Liberal e convivia com companheiros da rádio e TV do mesmo grupo empresarial, no início dos anos 1980. Fomos convocados para uma foto ao lado do prédio da TV, na avenida Nazaré, num domingo, bem cedo, em que se iniciavam as provas do vestibular para a Universidade Federal do Pará, em 1981. Aqui nesta foto estão apenas uma parte das equipes dos três veículos de comunicação. Como o horário combinado foi pela manhã, o pessoal dos turnos da tarde e noite não pode comparecer. Com a ajuda do cinegrafista José Carlos Raiol (o Grelha), consegui identificar boa parte da nossa turma. De pé - Alexandre Lima (fotógrafo do jornal); Caneco (filho do Odorico); Eurico Alencar (também fotógrafo do jornal); Waldemar Feitosa (chefe de reportagem da TV); Paulo Graça (cinegrafista); Marcos Pinheiro (cinegrafista); José Carlos Raiol (cinegrafista); Peter Roland (cinegrafista); Antenor dos Santos; Jimo Cupim; Edson; Gouveia Jr (cinegrafista);

36 anos da entrevista com Quintino e a resistência camponesa no Alto Guamá

Eu nem lembrava que foi no dia primeiro de agosto de 1984 que publiquei, no jornal O Liberal, a primeira entrevista com Quintino Silva Lira, líder dos posseiros da Gleba Cidapar, que reagiu à grilagem de terras e organizou um grupo para resistir aos pistoleiros da região da Pará-Maranhão (rodovia BR-316) entre os rios Guamá e Gurupi. Quem me ajudou a recordar aquele trabalho foi a pesquisadora Juliana Patrizia Saldanha de Souza, de Santa Luzia do Pará, mestra em Linguagens e Saberes na Amazônia pela Universidade Federal do Pará. Acompanhei desde 1983 aquele conflito fundiário que envolvia 10 mil famílias de pequenos agricultores e empresas agropecuárias, numa área de 387 mil hectares. Compartilho aqui a postagem que a Juliana fez sobre o nosso encontro virtual, em 15/08/20. As fotos são do repórter-fotográfico Alexandre Lima, durante uma de nossas reportagens na Gleba Cidapar, um ano antes da entrevista, em 25 de setembro de 1983. Diário de uma Pesquisadora: QUINTINO LIRA e eu!

Quando Sebastião voltou a morar no Tapajós

Em 1999 o músico Sebastião Tapajós me concedeu uma entrevista, em Santarém, para falar de sua volta à região Oeste do Pará, após morar mais de 40 anos fora de sua terra. Era um sonho que acalentava durante décadas. Queria poder navegar pelos rios Tapajós, Arapiuns e outros. Ele nasceu dentro de um barco, no rio Surubiú, em frente a cidade de Alenquer, e foi registrado com o nome de Sebastião Pena Marcião, em abril de 1943. Festejado nas principais metrópoles mundiais, o músico paraense era pouco conhecido em sua terra. Vendia mais disco no exterior que no Brasil. Não tinha comparação, também, o que recebia em direito autoral na Alemanha e no Japão, por exemplo, em relação ao que lhe pagavam aqui. Trazia no currículo a participação em concertos com ícones da música internacional, como Astor Piazzolla, Oscar Peterson, Paquito D'Rivera e de consagrados compositores brasileiros como Baden Power, Altamiro Carrilho, Hermeto Pascoal, Sivuca, Egberto Gismont, Paulo Moura e outros. Segundo

O fracassado Plano Nacional de Reforma Agrária e a reação da UDR

Em outubro de 1985 o primeiro presidente civil, após a Ditadura Civil-Militar (1964/1985), José Sarney, lançou o Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA), com a meta de assentar 1,4 milhão de famílias de agricultores. Mas a reação dos fazendeiros foi imediata. O atual governador de Goiás, Ronaldo Caiado, percorreu o Brasil para divulgar a criação da União Democrática Ruralista (UDR) e ameaçava enfrentar com armas à implantação do plano. Mais de 200 camponeses foram assassinados entre 1986 e 1987 e os assentados foram apenas 140 mil famílias, ou seja, 10% da meta do PNRA. A foto 01 (de 18 de abril de 1986) revela o momento de uma coletiva à imprensa, convocada pela CUT e por entidades de direitos humanos, para denunciar a violência no campo, por meio do simulado “Tribunal da Terra”. Em pé (da esquerda para a direita): advogado José Carlos Castro, da Comissão de Direitos Humanos da OAB-PA e do núcleo jurídico da SDDH; padre Ricardo Rezende Figueira, da Diocese de Conceição do Araguaia e

A trajetória de uma grande liderança camponesa

Hoje, 25 de julho, marca o Dia do Lavrador. Um dia de refletir sobre a importância do trabalhador e da trabalhadora da terra. Gente que produz alimentos para a mesa de todos. Que planta e cria. Especialmente os que integram a agricultura familiar. Para homenagear esse segmento social destaco a figura de uma grande liderança camponesa que dedica a sua vida à organização dos trabalhadores do campo. Avelino Ganzer, um gaúcho de Iraí (RS), instalado nas margens da rodovia Transamazônica, nos anos 1970, forjou-se na luta de resistência, ainda durante o regime militar, ajudando a construir delegacias sindicais e na pauta pelo direito de produzir. Do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santarém (PA), Avelino se destacou como liderança no movimento que articulava a criação de uma central sindical nacional, unindo trabalhadores urbanos e rurais. Ajudou na fundação da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e integrou a primeira direção da entidade, logo no início dos anos 1980. Daí em diante t

João Maria, missionário dos direitos humanos

Passou um filme pela minha cabeça ao tomar conhecimento do falecimento, hoje (02/07/20 ), do Padre João Maria Van Doren, 89 anos, missionário holandês da Congregação dos Crúzios, que chegou a Belém na década de 1960. Convivi com ele na igreja de Nossa Senhora Aparecida, em Belém, a partir de 1978. Era homem de diálogo fácil, fala mansa e de muita habilidade na condução dos temas espinhosos da época da ditadura militar de 1964. Conseguiu convenceu o Conselho Paroquia a ceder um espaço, nos altos do salão anexo à igreja, para abrigar a Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos humanos (SDDH), que ele ajudara a fundar em agosto de 1977. Foi ali, no salão da sua paróquia, que se reuniram as lideranças que fundaram a Comissão dos Bairros de Belém (CBB); de oposições sindicais; e as assembleias da própria SDDH e seus núcleos: de Imprensa (Jornal Resistência), Anistia e Jurídico. João Maria levou à risca a opção preferencial pelos pobres que a igreja católica fez a partir do Concílio Vatican

Curt Nimuendajú - o alemão que virou índio

Seguindo o exemplo do amigo Alexandre Velozo, publicarei, sempre que possível, uma homenagem a grandes vultos da história brasileira que nos legaram importantes exemplos de vida, luta, resistência e também na produção de estudos e trabalhos para o conhecimento científico. Hoje o nosso homenageado é o Kurt Unckel, alemão de nascimento, naturalizado brasileiro como Curt Nimuendajú (aquele que faz sua morada), como o chamavam os índios, que o adotaram como um dos seus iguais. Deixou uma herança que o fez conhecido no mundo científico como o pai da etnologia no Brasil e pioneiro da linguística. No Parque Zoobotânico do Museu Emílio Goeldi tem um monumento a Nimuendajú e sua cripta está no Cemitério do Redentor em São Paulo. Mais informações no link do site da Deutsche Welle, emissora internacional da Alemanha que produz jornalismo independente em 30 idiomas: Segue também o link do programa “Sustentabilidade”, apresentado pelo cacique Robson Miguel, cujo título é: Curt “Nimuendajú” Unke

Coronavírus atinge as comunidades indígenas

O coronavírus está fazendo estrago às comunidades indígenas. O sucateamento da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) torna os povos originários mais vulneráveis à covid19. Há mais de 30 anos a pauta daquelas comunidades era a proteção do seu território e também a assistência médica e sanitária aos índios. Em 1984 estive na aldeia Kokraimoro, em São Félix do Xingu. E em 1986 conversei, em Altamira, com lideranças do povo Assurini, da Terra Indígena Koatinemo, localizada entre os municípios de Altamira e Senador José Porfírio (fotos: Oldemar Alves). Torço para que as medidas aprovadas, esta semana, pelo Congresso Nacional (Plano Emergencial para Enfrentamento à Covid-19) que incluem ações emergenciais aos povos indígenas, quilombolas e outras populações tradicionais sejam implantadas o mais rápido possível.

A importância do leitor atento

Este ano de 2020 completei 45 anos de jornalismo. Iniciei na imprensa alternativa, no jornal “Bandeira 3”, editado por Lúcio Flávio Pinto. Em 1976 fui para a grande imprensa, ingressando na redação de O Liberal, onde publiquei minha primeira matéria assinada: “Tomé-Açu em busca de uma alternativa”. A reportagem, com fotos do veterano Raimundo Favacho, mostrava o impacto da fusariose, doença que dizimou o plantio de pimenta-do-reino no vale do Acará. Naquela época, os jornais disputavam a preferência do leitor pautando temas fora do cotidiano, especialmente nas edições de domingo. O termômetro que media a recepção do conteúdo eram as cartas, o aumento da venda avulsa e, em alguns casos, a inserção de matérias nos anais das casas legislativas. Às vezes, os textos, fotos e ilustrações, provocavam reações de autoridades, lideranças comunitárias, empresariais, etc e permitiam uma suíte, que no jargão jornalístico significa explorar o desdobramento de uma notícia ou reportagem. Em 9 de a

Ditadura escondeu surto de meningite na década de 1970

A tentativa de esconder os números da evolução da Covid19 lembra o episódio da censura que a Ditadura Civil-Militar de 1964 impôs à mídia, por ocasião do surto de meningite no Brasil, na década de 1970, conforme a matéria “Meningite, a epidemia que a ditadura não conseguiu esconder”, publicada no site do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (https://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Revista&id=216). E também o material do portal UOL “Surto de meningite na década de 70: o desastre da ditadura militar brasileira” https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/reportagem/surto-de-meningite-na-decada-de-70-o-desastre-da-ditadura-militar-brasileira.phtml. Tratei deste tema no meu livro “A Censura no Pará – a mordaça a partir de 1964”, publicado em 2015 pela editora Paka-Tatu. A partir da página 146, com o subtítulo “No microscópio do Exército”, conto o caso envolvendo o jogador de futebol Oliveira Pipoca, da Tuna Luso Brasileira, que morreu em 1975, em Belém, de uma doe

Bruno Sechi também defendeu a reforma agrária, combateu a violência no campo e foi solidário com os padres e posseiros do Araguaia

A luta e empenho do Padre Bruno Sechi pelo direito da criança e do adolescente marcou sua trajetória de vida. Deixou uma obra extraordinária de respeito, acolhimento e orientação às crianças pobres da periferia de Belém. Sua morte, na última sexta-feira (29/06/20), comoveu a população da cidade. Seu espírito humanista norteou também sua atuação em outras áreas da igreja católica, como por exemplo, na Comissão Arquidiocesana, onde atuou com muita firmeza na defesa dos interesses dos camponeses e da ação pastoral da chamada ala progressista do clero brasileiro, identificada com as orientações do Concílio Vaticano II, que “proclamou a necessidade de mudanças nas estruturas de um sistema gerador de injustiças sociais". Italiano da região da Sardenha, Bruno nasceu em 1939 e se naturalizou brasileiro logo que chegou ao Brasil, no final da 1960. Liderou um grupo de jovens na organização da República do Pequeno Vendedor, em solidariedade às crianças que trabalhavam no mercado do Ver-O-

Campanha MARAJÓ VIVO - Covid 19 cresce assustadoramente nos municípios do arquipélago

Todos já ouviram falar da grandiosidade do arquipélago do Marajó, no Pará, na confluência dos rios Amazonas, Pará, e do oceano Atlântico. Conta com 16 municípios e aproximadamente 3 mil ilhas e ilhotas. Um mundo de água, com áreas de floresta, campos naturais, lagos e um labirinto de furos, canais e igarapés. De janeiro a maio, boa parte do território fica alagado. E na estiagem, no segundo semestre, algumas áreas enfrentam seca que chega a rachar o solo dificultando a captação de água para consumo humano e animal. A região abriga o maior rebanho de búfalos do País e o queijo artesanal do Marajó é um dos mais premiados no Brasil e do mundo. A produção de peixe de captura é extraordinária e um levantamento já identificou mais de 60 espécies comercializáveis. A região dispõe de belas praias de água doce e abriga a Floresta Nacional de Caxiuanã, a Flona mais antiga da Amazônia, criada em 1961 e administrada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), no municí

Um tributo a Luiz Maklouf

A morte do Mak (Luiz Maklouf Carvalho), neste sábado (16/05/2020), mexeu com todas as pessoas que conviveram com ele aqui em Belém. Além da sua contribuição política no movimento estudantil, nos anos 1970, deixou uma marca profunda no processo de construção da Sociedade Paraense de Direitos Humanos - SDDH (1977) e criação do “Resistência” (1978). Junto com Paulo Fonteles e José Maria Souza (ambos já falecidos) ele se empenhou na viabilização do jornal, que nasceu rompendo com o conceito de imparcialidade, objetivismo e sensacionalismo. A biografia do jornalista Maklouf formou-se numa simbiose com o jornal, uma forte referência da luta pela democracia no Pará e no combate à ditadura de 1964. E isto está expresso na capa: “Resistir é o primeiro passo”, bem abaixo do título. E no editorial da primeira edição, a sua linha de compromisso: “um jornal que assuma uma posição, que se coloque ao lado do time mais fraco, sabendo-o, de longe, o mais forte”. Mak foi o primeiro editor do “Resistên