A tradição do esporte como trégua aos conflitos começou na Grécia, no século 776 antes de Cristo e deu origem aos Jogos Olímpicos. Atualmente, o futebol, que mobiliza multidões, desperta intensas paixões, mas, também, gera conflitos e verdadeiras guerras entre as torcidas. Em Belém, onde se realiza um dos maiores clássicos do futebol brasileiro, o “REPA” (Remo x Paysandu), um episódio surpreendeu as duas grandes torcidas do Pará, há 41 anos. Os dois ídolos dos clubes comemoram seus gols com um comportamento inusitado.
Em 1979, o jogador Dadá Maravilha, o Dario José dos Santos, tricampeão de futebol pela Seleção Brasileira, no México, e com passagem pelo Flamengo, Atlético Mineiro e Internacional de Porto Alegre, foi contratado pelo Paysandu. Sua chegada a Belém provocou uma grande euforia na torcida do Papão, que não ganhava o campeonato paraense há dois anos. Já o bicampeão Remo, tinha como ídolo o brilhante jogador Bira (Ubiratã Espírito Santo), que foi revelado pelo futebol amapaense.
No clássico de 26 de abril daquele ano, com o estádio do Mangueirão (na época só uma banda estava construída) lotado, o artilheiro Bira abriu o placar e correu para comemorar nos braços de Dario. O gesto encantou as duas torcidas. Antes de terminar o jogo, Dadá Maravilha empatou e retribuiu com nobreza a atitude de Bira. As duas torcidas aplaudiram os opositores.
Nós que fazíamos o alternativo “Resistência”, também demos uma trégua à pauta de combate à ditadura e fizemos uma edição especial para circular no dia do jogo. Entrevistamos os dois ídolos e fomos para rua vender o jornal. Eu e Waldemar Azevedo fizemos a entrevista com o Dario, e o Miguel Chikaoka fez as fotos. Não lembro quem entrevistou o Bira, mas a ilustração da capa foi feita pelo Félix da Paixão.
Aquele foi um ano de muito simbolismo, pois foi também num estádio de futebol, o Estádio da Vila Euclides, em São Bernardo do Campo, que os metalúrgicos do ABC Paulista romperam com a legislação ditatorial e fizeram uma assembleia geral, no dia 13 de março, naquele campo de futebol, lotado por 80 mil trabalhadores, exigindo 65% de reposição salarial. Aceitaram também uma trégua de 45 dias. Ao final, em maio, ganharam 63% de reajuste e encerram a greve.
As duas histórias distintas apontam que um estádio tanto pode servir de palco de grandes disputas esportivas quanto para conquistas salariais. Ou, como acontece nesta quarentena da Covid 19, para abrigar moradores de rua, como é o caso do Mangueirão, e do Pacaembu, em São Paulo, que cedeu o gramado para funcionar um hospital de campanha (Paulo Roberto Ferreira - 19/04/2020)


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