Bruno Sechi também defendeu a reforma agrária, combateu a violência no campo e foi solidário com os padres e posseiros do Araguaia
A luta e empenho do Padre Bruno Sechi pelo direito da criança e do adolescente marcou sua trajetória de vida. Deixou uma obra extraordinária de respeito, acolhimento e orientação às crianças pobres da periferia de Belém. Sua morte, na última sexta-feira (29/06/20), comoveu a população da cidade.
Seu espírito humanista norteou também sua atuação em outras áreas da igreja católica, como por exemplo, na Comissão Arquidiocesana, onde atuou com muita firmeza na defesa dos interesses dos camponeses e da ação pastoral da chamada ala progressista do clero brasileiro, identificada com as orientações do Concílio Vaticano II, que “proclamou a necessidade de mudanças nas estruturas de um sistema gerador de injustiças sociais".
Italiano da região da Sardenha, Bruno nasceu em 1939 e se naturalizou brasileiro logo que chegou ao Brasil, no final da 1960. Liderou um grupo de jovens na organização da República do Pequeno Vendedor, em solidariedade às crianças que trabalhavam no mercado do Ver-O-Peso, nos anos 1970.
Teve destacada atuação na campanha em favor da criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e recebeu o 5º Prêmio USP (Universidade do Estado de São Paulo) de Direitos Humanos 2004.
No início da década de 1980, o padre salesiano agiu com muita firmeza na defesa dos padres franceses Francisco Gouriou e Aristides Camio, presos em agosto de 1981, junto com 13 posseiros de São Geraldo do Araguaia, acusados de participação num conflito fundiário, como revela matéria publicada no jornal “Resistência”, edição 36, de abril de 1982, que vai publicada na íntegra:
Pe. BRUNO SECHI
Os pobres começam a sentir que têm direitos. E os choques ocorrem
Para o padre Bruno Sechi, da Comissão Arquidiocesana, que acompanha o desenrolar do caso São Geraldo, uma coisa que já foi dita muitas vezes, mas que deve ficar bem clara, é que com o processo contra os padres Aristides e Gouriou o que se está querendo, na verdade, é calar a boca da igreja que, através de seus agentes, sente a obrigação de esclarecer o povo sobre os direitos que ele tem.
Em sua opinião, choque como o de São Geraldo do Araguaia ocorrem na medida em que os pobres começam a sentir que também têm direitos e reagem a uma negação desses mesmos direitos. Explica que, muitas vezes, problemas como este deixam de acontecer devido a uma calma aparente, que significa na verdade, falta de organização popular e um desconhecimento de seus direitos.
Na medida em que o povo reage, diz Bruno, nesta hora deveria entrar na questão o órgão público para amparar os seus direitos, o que não ocorre. Assim, esta omissão vem a gerar os choques entre fortes e fracos. A seu ver, responsabilizar a ação pastoral da igreja por estes choques significa esquecer o maior responsável pelo problema, ou seja, o órgão público, “que deveria defender o direito da população”.
“Pior ainda é quando este órgão público se coloca ao lado do mais forte, em detrimento dos direitos do mais fraco”, observa ele, que concorda que no sul do Pará, área de inúmeros conflitos de terra, existe uma espécie de pacto entre o Getat (Grupo Executivo das Terras do Araguaia-Tocantins), a Polícia Federal e os grandes fazendeiros, sempre unidos na repressão e supressão dos direitos dos sem-terra.
No seu entender, é necessário esclarecer à população de uma forma mais objetiva, sobre os seus direitos, sendo que neste trabalho os movimentos populares têm uma função muito importante, a partir do momento em que se sabe que, os órgãos da grande imprensa, muitas vezes, não retratam exatamente o que acontece, ou quando retratam o fazem dentro de uma versão parcial, que não é a do pobre, do oprimido.
Outro fator de grande importância, lembra, é despertar um senso de solidariedade, promover uma maior interação entre as camadas pobres de todos os locais do País. Por outro lado, considera também que a solução para o problema fundiário brasileiro deve ser procurada no nível de mudança do atual sistema socioeconômico do Brasil, para um sistema que corresponda aos interesses da grande massa.
Uma reforma agrária verdadeira, comenta, entra em choque com o capitalismo porque prejudica os grandes latifundiários e as grandes empresas. “Pelo próprio tempo que o caso está levando parece que se nota um certo cansaço”, afirma padre Bruno, ao ser indagado sobre a diminuição dos protestos e denúncias por parte das entidades, quanto a prisão dos padres franceses e dos 13 posseiros.
Ele acredita, entretanto, que com a aproximação do julgamento dos padres e posseiros deverá haver uma maior exploração do assunto, visando a manter viva toda esta problemática. Isto é, à medida em que se aproximar o final do processo, vai-se reavivar o senso de participação de cada um. Ao lado disso, salienta, é preciso também que a igreja continue se manifestando constantemente sobre o problema, e que denuncie que, no processo, “a gente sente toda uma farsa”.
Quanto ao trabalho que vem sendo realizado pela Comissão Arquidiocesana, Bruno diz que tem sido voltado para o esclarecimento de todas as paróquias de Belém, para que com isso se suscite um amplo debate sobre a questão. Neste trabalho, a Comissão também procura esclarecer aos demais pontos do País, sobre o episódio de São Geraldo do Araguaia.
Para tanto, a Comissão remeteu à CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) um relatório onde é mostrado, em detalhes, tudo o que até aqui já se conseguiu constatar. Este documento, uma vez que seja amplamente divulgado, servirá para minorar os efeitos de “uma falta de informação incrível sobre o caso, que a gente percebe nas outras partes do País”.







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