Hoje trago mais uma preciosidade da minha arca de relíquias. O cartunista Henfil (Henrique de Souza Filho – 1944 a 1988), ficou conhecido em todo o Brasil por sua participação no jornal alternativo “O Pasquim”. E foi o criador de personagens inesquecíveis como os “Fradinhos”, o “Capitão Zeferino”, a “Graúna”, o “Bode Orelana” e “Ubaldo, o paranóico”. Ele também escrevia uma coluna semanal da revista “IstoÉ”. na forma carta para a sua mãe.
Foi lá que Henfil publicou, em 16 de março de 1983, a notícia da invasão da gráfica Suyá, em Belém, e a perseguição aos jornalistas do jornal “Resistência” da SDDH (em outubro de 1982), como parte da escalada da ditadura civil-militar (1964-1985) contra as bancas de revistas e o atentado no centro de convenções Riocentro, na véspera do Dia do Trabalho, no Rio de Janeiro, em 1981.
“Mãe, me lembro quando queimavam bancas – iniciou Henfil – e distribuíam listas negras aos jornaleiros. Aquele que teimasse em vender jornais nanicos seria incendiado”. O jornalista aproveitava também para criticar a autocensura da mídia hegemônica: “Procurava nos grandes jornais escritos e falados e só via notinhas e nenhum editorial.”
E o cartunista prosseguia: “Aí passaram a queimar também bancas que vendiam revistas eróticas, a dinamitar livrarias, a depredar escritórios de advogados. Procurava nos grandes jornais escritos e falados e só via notinhas, sem seguimentos e nenhum editorial.”
Continuava Henfil: “Um dia se explodiram no Riocentro. Me lembro quando prenderam na Lei de Segurança Nacional os jornalistas Paulo Roberto Ferreira e Luís Carvalho, do jornal nanico Resistência do Pará. Procurei nos grandes jornais e só vi notinhas e nenhum editorial.”
A carta semanal do cartunista cita as perseguições a outros jornalistas dos pequenos veículos que faziam oposição ao regime, até chegar no dono do famoso e poderoso Estadão.
“Aí prenderam na LSN os jornalistas Ricardo Lessa e Pedro Camargo, do nanico Hora do Povo. Aí prenderam com presos comuns o jornalista Juvêncio Mazzarollo, do nanico Nosso Tempo, de Foz do Iguaçu. Aí prenderam os jornalistas Osmar Trindade, Rafael Guimarães, Rosvita Laux e Elmar Bones, do Coojornal de Porto Alegre. Procurei nos grandes jornais e só vi notinhas e nenhum editorial.”
Henfil encerra a coluna citando parte do poema “No caminho com Maiakovski”, publicado pela primeira vez em 1982. “Então querem prender Júlio de Mesquita Neto, diretor do grande O Estado de S. Paulo, e então querem prender José Carlos de Assis, da grande Folha de S. Paulo. Então me lembro do poema de Eduardo Alves da Costa no seu livro Salamargo:
Na primeira noite eles se aproximam
E roubam uma flor do nosso jardim
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem:
Pisam as flores, matam nosso cão
E não dizemos nada.
Até que um dia o mais frágil deles
Entra sozinho em nossa casa,
Rouba-nos a luz,
E, conhecendo o nosso medo,
Arranca-nos a voz da garganta
E já não podemos dizer nada.
Em 1985, Eduardo Alves da Costa republicou sua obra em outro livro, pela editora Nova Fronteira, agora com o título do famoso poema: “No caminho com Maiakovski” (Paulo Roberto Ferreira/maio 2020).













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